AASPTJ-SP divulga nota pelos 30 anos do ECA

O Brasil dos Códigos de Menores (de 1927 e 1979) foi cenário de ausência de direitos para gerações inteiras de brasileiros que se tornaram adultos sem um contexto social e político que lhes garantisse participação ou proteção. Por muitas décadas, sob essas legislações, a infância foi objeto de tutela dos adultos, exercida de forma discricionária e centralizadora, sem qualquer garantia democrática. Esse tempo, não tão distante assim, limitava crianças e adolescentes a objetos de medidas judiciais, sem direito à participação ativa e, quase sempre, restrita a medidas hoje consideradas extremas, como a institucionalização. Atribuía-se a responsabilidade pela “situação irregular” à própria pobreza, concretizando um projeto de controle da população orientado por ideias e interesses higienistas, patologizadores e criminalizadores.

A redemocratização brasileira, no fim do séc. XX, tornou aquelas legislações inconstitucionais, e, impulsionada pelo mesmo empuxo de conquista de direitos da constituinte e da participação de movimentos sociais, estabeleceu conjuntura que não só permitiu o desenvolvimento do Estatuto da Criança e do Adolescente como também foi por ele impulsionada.

Surgia assim, exatamente trinta anos atrás, o que viria a ser um marco ético-político para direitos infanto-juvenis e um novo paradigma de proteção. O ECA veio exigir mudanças de todo o conjunto da sociedade para responder a uma concepção de criança e adolescente não mais objeto de tutela mas como sujeito de direitos, rompendo em definitivo, no plano formal, com a doutrina da situação irregular, corrente doutrinária pela qual eram tratados como “menores”, sub-seres jurídicos, coisificados e assujeitados. Agora cidadãos, crianças e adolescentes passaram a ser titulares de direitos e, dessa forma, todas as prestações do poder público e da sociedade deixaram de ser intervenções assistencialistas ou tutelares para serem legitimamente exigíveis e de cumprimento prioritário.

Nessa mudança radical, houve impactos em serviços e políticas públicas. No Poder Judiciário, o ECA impulsionou a necessidade de criação das Varas da Infância e Juventude e, para assessorá-las tecnicamente e, assim, banir o elevado grau de discricionaridade que havia nos antigos Juizados de Menores, preconizou a presença de equipes técnicas interprofissionais nesses espaços institucionais. Desde então, profissionais do Serviço Social e a Psicologia tornaram-se agentes fundamentais na garantia de direitos dos que acorrem ao Judiciário ou que a ele são encaminhados, proporcionando acolhimento, escuta e a devida participação de crianças e adolescentes – que não se confunde com extração e verificação da “verdade”.

Dessa forma, a genealogia e a história das equipes técnicas de assistentes sociais e psicólogos judiciários têm no ECA uma referência fundamental, a partir da qual nossos compromissos profissionais se conectam com os da luta por garantia, promoção e defesa de direitos de crianças e adolescentes, e com a busca de um projeto de sociedade democrática e cumpridora da proteção integral.

Ciente de seu papel como parte de um coletivo de profissionais atuante na proteção integral de crianças e adolescentes nesses trinta anos, a AASPTJ-SP vem a público saudar os que valorizam e defendem o ECA, e, também por isso, lutam por um país mais democrático e verdadeiramente protetivo.

São Paulo, 13 de julho de 2020

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